O ano agora é 1955, ele, Pedro, um rapaz de posses, moreno, alto, bonito, com sérios problemas com o pai, que o obrigou a escolher a profissão de advogado, dizendo que não pagaria faculdade para o filho ser médico de cachorro. Ela, Cecília, uma jovem bonita, alta, magra, pele branca, olhos e cabelos castanhos, filha de um casal em crise, o pai alcólatra e a mãe desequilibrada.
Ele namorava a amiga dela e ela o amigo dele, às vezes se encontravam, mas eram apenas conhecidos. Os namoros terminaram e num baile no clube da cidade, ele a tirou para dançar. Ela recusou, dizendo que a música era agitada demais, ele a desafiou, dizendo que ela era muito certinha e que já chegara a hora de se desligar de vez do ex-namorado. O que ele não sabia é que ela não gostava de ser desafiada, então aceitou dançar com ele e, depois daquela noite foram muitos bailes juntos.
Engraçado que logo depois, ela fugiu dele na praça onde os jovens se reuniam naquela época. Falara para as amigas que não gostara de tê-lo beijado no baile, mas ele a encontrou e convenceu-lhe a dar outros beijos e, foram muitos beijos soltos, sem compromisso. Quando se encontravam o coração dos dois batia tão acelerado, quando ele a erguia em seus braços, os lábios se encontravam, o baton vermelho borrava as bocas, os risos eram tão simples.
Assim ficaram durante muito tempo, até que um dia Cecília, disse que queria namorar, senão, não ficariam mais aos beijos. Foi decisivo para ele, dançaram a noite toda, extremamente encantados e no intervalo, ela cantou uma música olhando nos olhos dele, todos em volta notaram. Assim era ela, transparente naquilo que sentia, quando feliz ou triste, zangada ou calma, satisfeita ou irritada, tudo saltava-lhe os olhos. Ele o inverso, sempre sombrio, distante, calado, era com muita dificuldade que ela o fazia falar de seus sentimentos.
Terminaram muitas vezes e muitas vezes reataram, sempre porque ele tinha bebido demais, esquecido algum encontro ou brigavam sem motivo mesmo. Ele sempre a procurava e pedia desculpas, os amigos intervinham dizendo o quanto ele estava arrasado. Uma vez num Carnaval, ela conheceu outro rapaz, brincaram todos os dias juntos, e ele na frente ameaçando arrumar uma confusão. Depois no penúltimo dia, ele também namorou outra moça. Ficaram um de frente para o outro. No dia seguinte, o inesperado aconteceu, no final do baile, quando a banda saiu pela rua para finalizar o Carnaval, os dois se olharam e aos beijos reataram mais uma vez.
Era assim que a paixão acontecia para eles, sempre repleta de desassossego e confusões. Um dia chegou bêbado na missa pelo um ano de falecimento de um parente dela, estava cambaleando, ela o tirou de dentro da igreja e ele disse coisas horríveis. Assim terminaram, dessa vez por muito tempo.
Estavam um ano separados, quando num baile ele se aproximou, a tomou em seus braços e disse que precisava dela mais do que qualquer coisa, ela o abraçou e disse que aquilo era paixão. Foi uma noite linda, de muitos beijos e confissões apaixonadas. No dia seguinte a revelação: ele tinha uma namorada!
Ela jamais o perdoou, nunca sequer olhou novamente para ele, seu nome era proibido e numa tarde de verão, chegou o convite do enlace dele com aquela moça, quatro anos depois. Ela achou que isso não havia lhe atingido e simplesmente esqueceu.
Teve alguns namorados, escolheu um deles para entregar sua virgindade, para aquela época muito importante, vários anos mais tarde, teve muito prazer, quis entregar a alma, mas não foi amor. Costumava dizer que, nessa vida teve amor sem sexo e sexo sem amor, e que imaginava como teria sido ter ambos. Era feliz, bem-humorada, inteligente e muito sagaz. Viveu cercada de amigos, festejava qualquer coisa, fez muitas viagens e nunca parou de buscar o amor. Quando morreu, deixou uma lembrança boa naqueles que conviveram com ela.
Ele viveu uma vida sisuda, tornou-se tudo o que não era, ou pelo menos o que não queria ser. Sempre acompanhado apenas pela família, teve poucos amigos, não frequentava festas e pouco sorria. Muitas vezes quando ouvia uma música, ou lia um livro, ou mesmo quando olhava para o céu numa noite de muitas estrelas, lembrava-se dela, e pensava no quanto poderia ter sido diferente. Partiu da vida como viveu, em silêncio.
Morreram ambos no ano de 1985. Não se sabe se foi amor, mas durante muito tempo um passeou no pensamento do outro, como uma velha lembrança boa, sempre com a indagação de como poderia ter sido, mas simplesmente não aconteceu.
3 comentários:
A narrativa é brilhante como sempre, pois conquista o leitor.
Tantas histórias daquela época que se mesclam a essa! Parece uma realidade muito conhecida...
Adorando...
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